É como voltar ao passado, mas de
um ângulo diferente. Confesso que ainda não me acostumei. Mas a sensação é a
melhor possível.
Antes, eu lhe segurava a mão, apertava-a,
buscando segurança ao atravessar a rua, ao fugir das aglomerações dos centros
urbanos, em busca da mesma direção, buscando não me perder dela e de seus
cuidados de mãe.
Hoje é ela quem aperta meu braço,
temendo todos os movimentos bruscos, aleatórios, confusos, barulhentos e
desorganizados da selva de pedra. É ela quem pergunta se é por aqui ou se é por
ali... é ela quem pergunta se aquele ônibus, cuja bandeira ainda é ilegível (e
pra ela, hoje, mais ainda, por conta da vista cansada de tantas labutas), vindo
na linha do horizonte de cinza asfalto, placas e faróis, é o ônibus que
precisaremos pegar para voltar pra casa – ou para fugir dela.
Antigamente eu olhava admirado
pelas janelas dos coletivos todas as coisas novas, tudo aquilo que eu não via
com tanta freqüência ou simplesmente nunca tinha tido a oportunidade de ver.
Lia as placas que passavam às ordens das leis do movimento e repouso, tentando
capturar todas as informações possíveis antes que ficassem para trás.
Hoje ela é quem cola as mãos nos
vidros, com as palmas abertas, fascinada com o balé das ondas no mar, com o
farfalhar das árvores nos parques densos (e raros), com a altura, cada vez maior,
dos arranha-céus de hoje em dia.
Antes eu via e pedia tudo o que
as vitrines podiam me mostrar.
Hoje ela sonha com as coisas que
vê e já tem em si a certeza de que terá tudo o que conseguiu me dar quando eu
não passava de menino... e as coisas das quais abdicou para ver meu crescimento
e felicidade.
Algo me diz que essa inversão de
papéis faz parte da lógica da vida e que um dia também me verei frágil e
necessitado de proteção novamente, como quando criança.
E espero merecer o mesmo amor dos
meus filhos quando esse dia chegar da mesma forma que ela merece todo esse amor
que eu carrego em mim.